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Reflexões sobre o drama de Demi Lovato, uma vítima do show business

Demi Lovato é uma jovem artista veterana (Foto/Facebook)

Ao longo dos últimos dias, a imprensa cultural tem acompanhado o drama da pop star Demi Lovato. Segundo os principais veículos de comunicação do mundo, na última terça-feira (24), a artista americana sofreu uma overdose.

Os problemas de Lovato com o vício não são novidades para os fãs. Lançada em junho de 2018, a música “Sober” versa sobre a batalha para tentar ficar sóbria, desde 2012. De forma sincera e sem rodeios, a letra fala sobre os problemas para lidar com seus vícios, conforme ilustra o quadro abaixo:

Demi abre o verbo sobre romper com a sobriedade (Reprodução/Letras.mus.br)

Demi Lovato tem 25 anos de idade e ingressou no show bussines aos nove, em 2002, quando fez parte do elenco da série de televisão infantil “Barney e Seus Amigos”. E foi justamente ali o “marco zero” do histórico de dramas pessoais da artista. Naqueles tempos, por ser uma criança acima do peso, ela sofreu bullying. Além dos problemas com os entorpecentes e assédio moral, Lovato já declarou e cantou sobre enfrentar as dificuldades com automutilação, anorexia e bulimia.

Com a palavra, a sociologia

Quando a artista Demi Lovato é colocada sob a óptica dos debates das ciências humanas, inevitavelmente esbarramos na obra do sociólogo francês Edgar Morin. A pop star é um exemplo do que Morin classifica como “olimpianos celebridades”, um tipo de ser que possui características e habilidades que “o distinguem dos demais mortais”. Protagonista da indústria cultural onipresente na mídia contemporânea, um “olimpiano” faz tudo aquilo que “os ‘reles’ mortais” desejam fazer. Entre outras façanhas, ditam normas de consumo, servem de modelo a ser seguido pelo público consumidor e possuem uma aura inalcançável.

O show business tira de Demi o direito de errar (Foto/Facebook)

Com bastante eficácia, a cultura pop faz com as estrelas da música [ou de quaisquer outras formas de arte] se tornem os grandes modelos que injetam cultura de massa nas veias da população, substituindo com isso os modelos básicos, como pais e professores. A maneira como os “olimpianos” agem, as palavras, gestos, vestuários, penteados, as relações amorosas, são assimiladas e facilmente digeridas pelos espectadores. No livro “A Sociedade de Consumo”, lançado em 2007, o filósofo francês Jean Baudrillard versa sobre os reflexos que o consumismo provoca:

Chegamos ao ponto em que o consumo invade toda a vida, em todas as atividades se encadeiam do mesmo modo combinatório, em que o canal das satisfações se encontra previamente traçado, hora a hora, em que o envolvimento é total, inteiramente climatizado, organizado, culturalizado

Com o advento da internet e da era da informação, todas as vozes podem ecoar. A reverberação é forte a ponto de estabelecer uma conexão bem mais próxima entre fã e ídolo. As antigas cartinhas envidas para o escritório do artista deram lugar aos posts e comentários publicados nas redes sociais. Indubitavelmente, os meios de comunicação digital colaboraram para a quebra do paradigma da condição inalcançável do “olimpiano”.

Bastante ativa nas redes sociais, Demi Lovato é uma artista que quebrou a “parede olimpiana”. Por meio de seus comentários, respostas diretas para os fãs e de suas músicas, ela sempre dialogou abertamente sobre os esqueletos que guarda no armário.

Celebridade vítima

A ruptura de paradigma supracitada provocou em Demi Lovato o “Complexo de Peter Pan”, um dos efeitos colaterais mais comuns do “olimpianismo”. Trata-se de complexo que provoca o desejo e/ou a necessidade de estar sempre jovem, bonito e impecável. É como se a questão da  humanização fosse impossível na vida de um pop star, isto é, assim como vários astros da música, Demi carrega obrigações que a impedem de suportar simples questões do dia a dia.

Apesar de ser dona do palco, Demi enfrenta a fúria de haters na web (Foto/Facebook)

Além do “Complexo” imposto pelo “olimpianismo” , não se pode ignorar o fato de que a permissividade das redes sociais trouxe para os holofotes as ações do hater. Esse ator social usa as máscaras da comunicação digital para disseminar comentários de ódio e críticas sem o menor critério. Uma foto usando uma camiseta velha, por exemplo, gera questionamentos sobre o bom gosto. Por sua vez, um single que não alcança lugares mais altos nas paradas de sucesso dá aos haters o direito de afirmar que o artista é um “fracasso”.

Diagnosticada com transtorno bipolar, Demi Lovato revelou que transtornos mentais podem gerar consequências gravíssimas, como o consumo exagerado de álcool e drogas. É impossível não linkar os “demônios interiores” da artista, as exigências do show business e a força que os haters exercem sobre ela. Nesse caldeirão de perversidades, Demi é apenas uma vítima de um sem-número de fatores que despertam seus comportamentos autoagressivos. No meio de tanta reticências, felizmente, ela tem o amor incondicional dos “Lovatics”, um exército de fãs que está disposto a ser o mais expressivo dos pontos de exclamações.

Força, Demi Lovato! O mundo da música pop precisa de você.

Foto de Gustavo Morais

Gustavo Morais

Jornalista, com especialização em Produção e Crítica Cultural. Pesquisador independente de música, colecionador de discos de vinil e mídias físicas. Toca guitarra, violão, baixo e teclado. Trabalha no Cifra Club desde novembro de 2006.

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